25 novembro, 2008

Em busca de uma crença

No começo muitas idéias, no meio muitas dificuldades, no fim muitas alegrias. Assim vejo o processo do nosso querido filhote que ainda tem muito a se desenvolver. Partimos de um tema pequeno, que parece delimitado, mas muito abrangente: PAI. Pensar no Pai não é tão fácil como pensar na Mãe. Há muitas metáforas que podemos centralizar no tripé PAI, PAZ E PAÍS, começando pela semente da vida, nosso pai, nosso semeador. Assim fomos desde o Biocentrismo à colonização paranaense, sem falar nas dificuldades dos filhos de mães solteiras... Meu pai, eu pensava que não sairíamos do lugar, mas saímos. Os primeiros dias de criação cênica foi um sofrimento, na verdade pode-se dizer que os primeiros meses foram sofridos. O teatro colaborativo pega muito lá no fundo dos sentimentos dos criadores, e muitas vezes entramos em crises existenciais. Tem-se que criar tudo, texto, personagens, cenas, e essa deve ser a explicação de todo o sofrimento. Percebi que ao longo do processo precisamos adaptar as formas de condução. É imprescindível a sensibilidade da Direção durante o processo de criação. Assim fez a Letícia, usando de várias táticas de condução até achar a que mais encaixa no trabalho dos atores. Outro aspecto mais que importante são as influências que sofremos. Um espetáculo com vários criadores está à mercê de tudo que o cerca. Quem assiste hoje o espetáculo “Estórias Brincantes de Muitos Paizinhos” percebe como o trabalho físico foi evidenciado, isso por trabalharmos simultaneamente em “A-corda”, com uma pesquisa de teatro físico com técnicas de precisão, conduzida pelo diretor paraguaio Wal Mayans. Durante a pesquisa do espetáculo entramos em várias discussões sobre interpretação, manipulação de objetos, teatro para crianças, teatro de grupo. Convivíamos praticamente 24 horas por dia pensando exclusivamente nas obras que estávamos em criação. Isso causou várias crises, e uma conclusão: não é pra qualquer um o trabalho árduo de teatro de grupo, viver em grupo. Dividir as crenças, os amores, as tarefas. Criamos laços bem semelhantes aos laços familiares de parentesco, além da intimidade compartilhada. Falando agora de teatro para crianças, a pesquisa mais sólida da Cia. do Abração, ressalto a descoberta da influência que temos na formação de opinião. É muito delicado o trabalho voltado principalmente às crianças mais jovens, aqueles que mais escutam e acreditam nos outros. Saber que cada um é um ser influenciável, mas único, é super importante. Não podemos falar ou mostrar qualquer coisa, não se pode pensar que eles não pensam, não podemos acreditar que eles estão ali, olhando nos nossos olhos, apenas pra passar o tempo. Temos uma missão muito valiosa, por isso não podemos banalizar o encontro sagrado (biocentrismo) que se concretiza no teatro. Cada coisa tem sua relevância, tudo o que vemos e sentimos existe para cumprir com alguma função ancestralmente fundada. Pensando nisso lembro-me dos cuidados e delicadeza do trabalho de manipulação de objetos, dar uma imensa relevância a um pequeno objeto, sem vida para muitos. Podemos relacionar a manipulação e abstração de objetos com a sacralização do nosso ofício, da nossa arte. Fazemos teatro por uma necessidade mais que vital, fazemos por uma necessidade filosófica, antropológica e até religiosa. Se não tratamos o teatro com o esmero necessário, estamos banalizando nós mesmos, nossa maneira de pensar e viver. Assim descobrimos que trabalhar com objetos também requer uma relação de respeito e seriedade. Ao observar uma criança brincando com todo e qualquer objeto que encontra, vemos o quanto seus pensamentos pulsam, vemos o quanto a sua fé cresce a cada história que inventa. Esse é um momento de seriedade e que merece respeito, a criança não é boba não, pelo contrário é mais esperta que muitos adultos. Assim, é revoltante quando alguns “intelectuais” da classe artística menosprezam a nossa arte, não só quando falam mal dos que realmente pesquisam, mas quando apresentam às crianças de todas as idades obras superficiais que só aliena e vicia. Overdose de drogas pesadas. Tenho muita consciência do quão é fácil falar o que pensamos. No processo de criação do “Paizinhos” estivemos em constante busca por tudo isso que discutimos, tiramos várias conclusões, teorizamos. Mas sei que é uma pesquisa que não tem fim, a cada dia nos transformamos, e a arte também. Fazemos um trabalho autêntico, nosso, afinal é feito por nós. Por isso que os momentos de reflexão e discussão são freqüentes na nossa pesquisa, uma pesquisa filosófica acima de outras coisas. Como o questionamento proposto pela Letícia: O que queremos deixar plantado pros nossos filhos? Do mesmo jeito que buscamos uma resposta para nosso singelo espetáculo, buscamos uma resposta para nosso caminho artístico, afinal tudo se reflete nas obras. Foi difícil, fomos imaturos muitas vezes, mas caminhamos pouco a pouco rumo a um ideal abstrato, que talvez Dionísio saiba onde está.

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